segunda-feira, 31 de agosto de 2015

‘Policial que descobre o cadáver não é responsável por morte’, diz Moro sobre críticas de que Lava-Jato piorou economia

Thiago Herdy - O Globo

Em palestra para empresários em São Paulo, juiz defende combate à corrupção sistêmica para melhorar situação do país


O juiz Sergio Moro, em fórum promovido pela revista ‘Exame’ em São Paulo - Marcos Alves / Agência O Globo


Em palestra para empresários em um hotel de luxo em São Paulo, o juiz Sérgio Moro rebateu na manhã desta segunda-feira a crítica de que a Operação Lava-Jato estaria causando prejuízos à economia, ao investigar as maiores empresas de infraestrutura brasileiras e, com isso, paralisá-las.

— O policial que descobre o cadáver não é o culpado do homicídio. Por mais que eventual impacto que a Operação Lava-Jato tenha no curto prazo nas decisões de investidores, no longo prazo esse enfrentamento da corrupção sistêmica traz ganhos a todos, às empresas e à economia — disse, durante o evento "Exame Fórum", organizado pela Editora Abril.

O juiz citou o caso da obra da refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco, cuja previsão inicial de custo era de US$ 2 bilhões e alcançou US$ 18 bilhões, de acordo com dados oficiais.

— Havia previsão inicial da obra em 2010, mas ela não acabou em 2010, 11, 12 ou 13. O primeiro trem de refino começou a funcionar em dezembro de 2014 — lembrou o juiz.


— Vejo com pesar essa situação econômica de recessão e eventualmente alguém faz um comentário de que a investigação dos crimes de corrupção tem uma parcela de culpa nisso. A Lava-Jato não tem a ver com o que aconteceu com a refinaria de Abreu e Lima.

(...) Não foi a operação que fez a obra ter seus custos elevados — argumentou.

Durante a palestra, Moro mencionou custos diretos da corrupção. Lembrou que a Petrobras admitiu, no último balanço, prejuízo de R$ 6 bilhões decorrente da elevação de custos em função do pagamento de propina a agentes. E destacou custos indiretos que considera "talvez até maiores que os diretos", como a interferência da propina no planejamento econômico de empresas e decisões de investimentos de estatais, além dos prejuízos para a livre concorrência.


— Se os agentes não têm confiança de que podem concorrer em condições iguais para obter contratos públicos, se existe uma zona sombria de pagamento de propina que traz vantagens a uns, isso gera severo impacto no regular funcionamento do mercado — afirmou, mencionando também a perda de confiança de investidores e cidadãos no funcionamento das instituições caso o combate à corrupção cesse.

— Como país, não vamos conseguir conviver com esse mundo cada vez mais competitivo. Os custos da corrupção sistêmica fazem a gente andar para trás e esse quadro tende a crescer se não for combatido — disse, afirmando que "ganhos futuros serão maiores que os custos imediatos".

Moro sugeriu que empresários criem, no Brasil, entidade parecida com a formada por donos de empresas na Itália na época da operação "Mãos Limpas", que investigou a relação do crime organizado com a política. O objetivo seria sensibilizar colegas e a sociedade, em geral, para dizer não à propina.