domingo, 16 de julho de 2017

"Quem financia a política", editorial do Estadão (Além das reforma trabalhista e da Previdência, país necessita de uma reforma política)

Além das reformas trabalhista e previdenciária, o País precisa urgentemente de uma reforma política. Além de caro e disfuncional, o sistema vigente promove justamente o oposto do que seria de esperar. Ele aumenta a distância entre a população e os partidos políticos e continuamente é causa de desequilíbrios na representação política. Mais do que ajustes pontuais, o Congresso tem de enfrentar temas estruturantes, como o pacto federativo, o sistema partidário e o financiamento das campanhas políticas.
A própria reforma política que tramita na Câmara, que deveria servir para corrigir erros, dá sucessivos sinais de caminhar em direção oposta. No início de abril, o deputado federal Vicente Cândido (PT-SP), relator da reforma política na Câmara, apresentou parecer que, entre outras sugestões, propunha a criação de um fundo, diferente do já existente Fundo Partidário, destinado a financiar as campanhas eleitorais de cada candidato. Só para as eleições de 2018 o tal “Fundo Especial de Financiamento da Democracia” custaria R$ 2,185 bilhões ao País.
Agora, três meses depois, informa o Estado que o deputado petista incluirá em seu parecer nova proposta, para que o valor do fundo seja de 0,5% da receita líquida do governo federal, o que faria com que o fundo recebesse em 2018 a absurda quantia de R$ 5,9 bilhões.
Em vez de prever mais dinheiro público para as campanhas políticas, o Congresso deveria aproveitar a tramitação da reforma política para rever o sistema de financiamento dos partidos com recursos públicos. Os partidos políticos são entidades privadas e, portanto, devem ser sustentados por seus filiados e simpatizantes.
Há dois graves problemas quando o Estado arca com a manutenção dos partidos políticos. Em primeiro lugar, ocorre uma abusiva utilização de recursos de toda a população para causas que não são de todos, já que os partidos são, por sua própria natureza, promotores de ideias e propostas específicas. Não é correto obrigar o cidadão a bancar com tributos a difusão de ideias políticas com as quais ele não está de acordo. Justamente por isso é que os partidos políticos são entidades privadas. Cabe à parcela da população que se sente representada por cada um bancar o custeio respectivo.
Em sentido estrito, o financiamento público de partidos políticos viola o caráter da isenção ideológica que deve nortear um Estado Democrático de Direito. Não ameniza essa violação o fato de a destinação de recursos a cada partido ser proporcional ao seu número de cadeiras no Parlamento. Essa proporcionalidade não legitima a interferência do Estado no balanceamento ideológico da sociedade.
Para ser verdadeiro tal argumento, seria preciso admitir por princípio que os cidadãos são ideologicamente neutros – o que não é verdade. Como é evidente, o único beneficiário desse sistema são os partidos que recebem o subsídio – nunca os cidadãos, nunca a sociedade.
Além disso, o financiamento da atividade partidária com dinheiro público estimula as legendas a se distanciarem do eleitor. Uma vez que os partidos recebem uma mesada do Estado – que tende a ser cada vez maior, como quer o relator da reforma política na Câmara –, eles não precisam atrair o cidadão.
Além de evitar que as empresas distorçam o resultado das eleições, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de proibir doações eleitorais de pessoas jurídicas tem o condão de produzir outro importante benefício para a qualidade da democracia no País. Ao diminuir as receitas dos partidos, a Suprema Corte compele os candidatos a sair às ruas, debater suas propostas, convencer a população e, depois, passar o chapéu para arrecadar os recursos necessários para custear suas atividades. Alguns políticos querem transformar essa medida saneadora em letra morta. Dizem que a democracia tem um custo e que cada um deve arcar com sua parte. Mas não há nada mais antidemocrático do que obrigar um cidadão a sustentar ideias e interesses dos quais discorda e que ferem fundamentalmente suas próprias ideias e interesses.