sábado, 9 de dezembro de 2017

"Passado sem glória", por João Domingos

O Estado de São Paulo

Vinte anos depois, o PSDB pode se redimir da derrubada da idade mínima


No momento em que o PSDB se reúne para escolher o governador Geraldo Alckmin seu novo presidente, e abrir espaço para que outras lideranças de alas opostas integrem a Executiva Nacional do partido, numa tentativa de se buscar a paz, os tucanos veem surgir à sua frente um novo dilema: tornar-se, pela segunda vez, o responsável por atrapalhar a reforma da Previdência. Isso, num prazo de 20 anos. E olha que o partido costuma dizer-se reformista.
No dia 6 de maio de 1998, três meses depois da aprovação do texto básico da reforma da Previdência, e da entrada do próprio presidente Fernando Henrique Cardoso e de seus ministros na batalha pelos votos, os partidos aliados concluíram que tinham condição de enfrentar a feroz oposição à proposta feita na época pelo PT e pelo PCdoB. Principalmente a parte que tratava da fixação da idade mínima para a aposentadoria, de 60 anos para os homens e de 55 para as mulheres, a mais polêmica de todas. Por causa do PSDB, que estava no governo, a idade mínima caiu e liberou até hoje a aposentadoria pelo INSS sem a exigência da idade mínima. Como hoje, já se falava que o coração da reforma era exatamente a idade mínima. 
Chegado o momento da definição, Fernando Henrique e seus estatísticos fizeram e refizeram as contas. Concluíram que o projeto passaria por uma margem pequena, mas passaria, porque o governo tinha os 308 votos mínimos garantidos. Era só derrotar emenda da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que buscava acabar com a exigência da idade mínima.
O momento era tenso. Fernando Henrique disse aos líderes, horas antes da votação, que a estabilidade da economia estava na dependência da idade mínima. Os então ministros Eliseu Padilha (Transportes), Renan Calheiros (Justiça) e Waldeck Ornellas (Previdência) mudaram-se para o Congresso. O próprio Fernando Henrique ficou de plantão para atender aos telefonemas de última hora de deputados.
Encerrada a votação, verificou-se este placar: 148 votos pela derrubada da idade mínima, 11 abstenções e 307 votos a favor. O governo fora derrotado. Pior: uma das abstenções viera justamente do deputado tucano Antonio Kandir, ex-ministro do Planejamento de Fernando Henrique. A oposição comemorou gritando o nome de Kandir. O deputado alegou que errara o voto. Em vez de apertar o “sim”, apertou o “abstenção”. O estrago fora feito. Dura até hoje.
Pois agora o PSDB não sabe se apoia a reforma da Previdência. Alckmin, que assume hoje a presidência do partido, diz que vai trabalhar pela aprovação do projeto, desta vez com exigência de idade mínima de 65 anos para os homens e 62 para as mulheres. Mas muitos congressistas tucanos dizem não ter interesse pela reforma. Uma das justificativas deles é a de que, se a emenda à Constituição for aprovada, ela poderá beneficiar o ministro Henrique Meirelles (Fazenda), que tem pretensões de se candidatar a presidente da República. Bobagem. Se o PSDB quiser, pode ajudar a aprovar a proposta e dizer que, 20 anos depois, está se redimindo da derrubada da idade mínima. 
Outros parlamentares tucanos acreditam que a aprovação, agora, da reforma da Previdência fortalecerá também, e muito, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que ficaria em condições vantajosas para negociar espaços na chapa presidencial.
Outra bobagem. Todas as vezes em que ocupou o poder, o PSDB dividiu a chapa com o PFL, cujo nome se tornou DEM. Assim como Lula dependeu do PR (ex-PL) de Valdemar Costa Neto, que lhe emprestou o vice José Alencar, e Dilma Rousseff de Michel Temer, eleito duas vezes vice da presidente cassada. Posição que levou Temer à Presidência da República e a se declarar um presidente reformista.