domingo, 21 de janeiro de 2018

"A roleta da Segurança"





José Vicente das Silva Filho, O Globo


A conta da violência nos últimos 10 anos: um milhão de mortos, incluindo o massacre do trânsito, ao custo de mais de três trilhões de reais, pelos parâmetros do Ipea. Segurança no Brasil se tornou um de seus maiores e mais graves problemas e, como tal, não admite respostas simples e baratas. A ideia de obter recursos para a segurança através da legalização do jogo é mais que oportuna. A arrecadação anual de impostos dos jogos pode superar os R$ 25 bilhões.

Destinando 30% desse dinheiro ao Fundo Nacional de Segurança poderia se financiar desde a infraestrutura de segurança das fronteiras (R$ 1,5 bilhão ao ano), a construção anual de 25 mil vagas prisionais (cerca de R$ 2 bilhões), investimentos nas polícias (R$ 1,5 bilhão em equipamentos, tecnologias, treinamento e sistemas), pagamento de horas extras para trabalho de 30 mil policiais em áreas críticas (R$ 2 bilhões), suporte da Força Nacional de Segurança (R$ 500 milhões).

Os recursos administrados por um conselho gestor com critérios claros quanto ao direcionamento do dinheiro para produzir impactos relevantes na redução dos crimes seriam repassados aos estados por projetos previamente aprovados no quadro de um Plano Nacional de segurança e mediante contrapartidas: programas de treinamento, de repressão à corrupção interna, de contenção da letalidade policial, de integração das polícias, de eficiência e metas de desempenho.

Não se cogita proibir a venda de bebida alcoólica de consequências mais danosas que o jogo, mas, diferentemente de 75,5% dos países membros da ONU, ainda patinamos em restrições antiquadas quanto à liberação do jogo.

O jogo clandestino é o crime organizado mais exuberante no Brasil, com movimento superior aos R$ 16 bilhões do tráfico de drogas, corrompendo autoridades em todo o país para proteger máquinas de jogos e centenas de cassinos clandestinos onde a população é lesada.

Por trás dos “inocentes” jogos há engrenagens sofisticadas e mesmo violentas do crime organizado beneficiado pela conveniente indiferença das autoridades, leniência de leis obsoletas e até cruzadas moralistas.

No projeto de lei no Senado, a previsão de controles de investidores, operadores de casas de jogos e apostadores estabelece dificuldades para lavagem de dinheiro que, como já se viu, prefere condições menos controladas como empreiteiras, imóveis, consultorias e até palestras.

Se a segurança das pessoas depende cada vez mais da sorte, que o jogo legalizado ajude a financiar boa parte das soluções da violência. Sem recurso suficiente jogaremos para um futuro distante e incerto a solução para esse problema tão grave, caro e urgente.

José Vicente da Silva Filho é coronel reformado da PM de São Paulo e ex-secretário nacional de Segurança Pública